domingo, 15 de junho de 2014

Sobre a Virtude...




É uma estrada. Já foi de ferro, hoje é de nada.
É um caminho abandonado, sem serventia humana, sem acesso, sem ligação.
Foi entalhada no vale de um rio que também hoje, tal qual a estrada, já não corre.
Suas bonitas paisagens, mesmo mutiladas nos últimos anos, ainda estão lá. A estrada corta florestas fechadas, que já foram bem exuberantes, mas ainda impressionam. Devido ao isolamento é fácil avistar bichos andando por ela. Catetos, iraras e bandos de guaxinins saem das moitas. Cascavéis se escondem embaixo das folhas de bambu, enquanto grande quantidade de pássaros passeia e canta pelas copas das árvores.
A luz amarela e suave da tarde penetra lateralmente pelas frestas das árvores, colorindo o chão de folhas e pedras.



Estava caminhando por ela nesta tarde. Andando sem pressa, respirando, ouvindo, vendo, pensando e fotografando. Bastante distraído. Já era final do dia, prestes a pegar o caminho de volta quando ergo o olhar e me deparo com um senhor, logo à minha frente.
Um senhor de barbas brancas, camisa de botão, um tanto surrada, mas bonita. Um aspecto meio cigano. Devia ter mais de 80 anos, montado em um cavalo. Apesar da idade, não tinha nada de decrépito. Chapéu preto tão velho quanto ele. Na garupa dele, uma menininha de no máximo uns quatro anos, descalça, cabelos pretos e longos, desgrenhados. Agarrada firmemente ao senhor, com rostinho colado nas suas costas.


Por algum motivo que não sei explicar, ele era o puro retrato da sabedoria. Ela, o puro retrato da inocência. Apareceram ali, não sei de onde.
Foram se aproximando, pensei que levaria uma bronca por estar em área particular. Respeitosamente o cumprimentei, ele retribuiu e parou para conversar. Sua voz, cansada pelos anos, era grave e firme.
Era um senhor simples, como tantos senhores que encontro e converso todos os dias.



Não sei se existe esse negócio de alma, mas se existir a minha soube na hora que eu estava diante de uma autoridade. Me falou poucas coisas, a maioria delas amenidades. Mas pra mim, essas amenidades me soaram como grandes lições, palavras de valor. Conversamos por breves minutos. Nos despedimos. Eles sumiram na floresta, da mesma forma como apareceram. Eu continuei meu caminho, mas muito impressionado, honrado e feliz. Ser bobo tem dessas vantagens: qualquer coisa impressiona. Pra mim é como se aqueles dois sempre foram parte desse lugar mágico. Esse encontro me fez ganhar bem mais que o dia.




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